sábado, 24 de janeiro de 2009

Pg - 08 - CONVERSÃO NA PÓS-MODERNIDADE

É interessante pensar nessa palavra, pois apesar de pequena, ela possui um significado grande e misterioso.
Destarte essa palavra se tornou um tema recorrente na atualidade, ela é compreendida unilateralmente, fora de um contexto existencial, político, sexual e econômico. Como se depreende, conversão se tornou sinônimo de mutilação.
À anulação de certos aspectos da vida em nome de uma “mudança” eu chamaria mais de “mecanismo de defesa” tão conhecido na teoria freudiana. O medo de ir adiante e romper desafios justifica comportamentos tíbios sob a égide da conversão. Não se vivem mais os grandes amores da vida, seja por uma pessoa em particular, seja por uma causa política ou social. Pelo contrário, olvidou-se das palavras e ações de Jesus que em tudo nos redimiu no seu aniquilamento em favor dos outros.
Na conversão pós-moderna há dois extremos: o alexandrino, do monofisitismo, onde Jesus teria sido apenas divino; e o antioquino, de Ariano, onde se afirma apenas a humanidade de Jesus. Nos movimentos neo-pentecostais Jesus é o grande Rei do Universo inteiro, milagreiro, triunfante e rico, não só de graças espirituais, materiais também. O tema é: Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em abundância. Nessa desesperada corrida pela “conversão perfeita” o capital é imprescindível, pois com esse tipo de conversão vem todo um marqueting visual, seja das camisas e dos modelos mais variados, dos adesivos para carros, motos, vidraças, etc... , há, também, a industria de áudio-visual, clips, cd’s e DVD’s e tudo mais o que o dinheiro possa “converter”. As excursões religiosas para o interior e para o exterior constituem capítulo extra. Tudo funciona mais ou menos do seguinte modo: se você é de Deus demon$tre, caso contrário você não o é. Padronizou-se a conversão, agora é estilo de vida. Deus é louvado como ídolo, imagem e projeção daquilo que queremos ser (Gn 3). Em contrapartida, os problemas sociais, preconceitos, luta de classes, marginalização, pobreza, corrupção e violência são tidos como influências demoníacas que isentam os homens de suas responsabilidades, cabendo só a Deus o julgamento e a punição desse mundo. Toda a mística dos neo-convertidos está em lançar um olhar para o céu e nunca mais tornar a ver a terra; vale lembrar que essa temática foi tão combatida por Paulo na sua segunda carta aos coríntios.
Na outra ponta temos uma luta de classes e de direitos que hipervalorizam o social e o político em detrimento do existencial e do transcendente. O pensamento vigente é de revolta e não de conquista para o amor. Aqui a conversão se dá no caminho extenuante para o calvário sem perspectiva de ressurreição. Acima, nós temos uma gloriosa ressurreição sem a bagagem da opção preferencial pelos mais fracos e pobres, sem a passagem pela cruz. É como se tivéssemos somente dois Cristos: o do Gólgota ou da Sexta-Santa X o do domingo da ressurreição.
No exemplo mais perfeito de conversão que temos, Jesus, vemos uma perfeita comunhão do Pai com os seus. Jesus é o mais puro reflexo daquilo que Deus quer para seus filhos. Quando o Mistério se encarna é fato que isso acontece para a alegria daqueles que viviam na marginalização. O grande centro religioso da época era Jerusalém e Deus “cai do céu” é na periferia no meio dos pecadores. Conversão, hoje, é sinônimo de separação, vai dizer isso a Jesus e esperar dele uma resposta... A moda é: converteu-se, então separe-se, radicalmente, dos antigos amigos como se você tivesse subido um degrau a mais que eles. Não que não haja amizades um tanto perigosas, mas se Jesus fosse pensar nisso... Por falar nele vamos relembrar seu círculo de amizades. Entre os mais íntimos estavam sicários ou zelotas, modernamente falando, guerrilheiros, judeus cobradores de impostos, sumariamente tidos como traidores, analfabetos como alguns dos pescadores seus amigos, pecadores públicos e ladrões como Zaqueu. Ele também entretinha amizades com mulheres de vida suspeita, hospedava-se em suas casas por mais escandaloso que fosse para a época, Marta e Maria, e acima de tudo “curtia” tão bem a vida que foi difamado de comilão e beberrão (Lc 7,34).
O que fariam os convertidos de hoje se pudessem fazer uma viagem no tempo e presenciar certos momentos da vida do Mestre? Na certa o taxariam de pseudo-profeta, impostor, ou na linguagem de hoje diriam que Ele estaria dando contra-testemunho. Na verdade empanou-se tudo aquilo que Jesus viveu e deixou como mensagem maior. As palavras podem até mover, mas são os exemplos que arrastam. Jesus era um homem de muita oração mas também de ação. Ele não rezava para que Deus fizesse o milagre da conversão na vida dos outros sem que Ele se envolvesse pessoalmente nisso. Porém não como juiz mas como alguém que ama muito Ele se entregava às relações fossem elas suspeitas ou não e não media esforços ou tempo para se dá aos outros. Certa vez chegou até a dormir dentro de um barco durante uma tempestade, tamanho era o cansaço (lc 8,23). Jesus era um contínuo ser-para-os-outros. Ao invés de separar-se das massas, como os santos de hoje, Jesus ia de encontro à elas, pois se alimentava de uma profunda experiência de amor que vinha do Pai e que não podia esgotar nele, tinha que passá-la adiante.
No sermão da montanha as diretrizes apontadas pelo Mestre são sempre em função do outro. Logo não há conversão num deserto, no sentido literal da palavra. Conversão não pode ser associada somente ao modo de se vestir, ou aos grupinhos que se freqüenta ou a maneira de falar. É mais que isso. É inclusão dos marginalizados no seio da sociedade (Lc 6,6ss). É luta constante para que se valorize a vida acima de toda e qualquer lei, mesmo religiosa (Mc 2,23-28). É denúncia (Lc 6,24-26) etc... Nesse caminho urge a necessidade de se ver os problemas que afligem o próximo, seja a comensalidade, a hospitalidade, o direito a vida digna etc...
Já apregoou um velho ditado: Para se tirar alguém que está na lama a que se sujar ao menos as mãos.

Nonato -Teólogo

Nenhum comentário: